segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Amor Maligno 
Certo dia , Sophia andava pela rua sem destino, nesse dia ela acordou feliz, animada, destinada a fazer o bem distribuindo sorrisos, mas o que ela não imaginava era que ia ser salva na calçada por onde caminhava por um homem sombrio. A partir daquele momento ela se viu perdida naqueles negros olhos surreais, as mãos do rapaz a segurava cuidadosamente, e naqueles milésimos de segundo ela examinou seu herói, o rapaz vestia completamente de preto, usava boné e casacos, cobria boa parte do seu musculoso corpo e isso a deixo ao mesmo tempo curiosa e apavorada. Após acordar de sua breve distração ela se viu sozinha no meio da rua, e ficou se perguntando o que havia acontecido, seria parte do real ou imaginário? Por um momento ela agradeceu por aquela criatura tenha desaparecido, mas sua teimosia a fez ir atras do seu paradeiro para agradecer, afinal de contas se não tivesse sido derrubada ela seria atingida por uma faca que caiu do prédio inexplicavelmente.
Passados os dias , saindo a noite com as amigas , Sophia passou pelo mesmo local onde um dia foi derrubada pelo sombrio homem, que nunca esqueceu, e deu de cara com ele, completamente bêbada ela correu atrás dele, nesse exato momento ela foi atropelada indo a óbito e seu espírito assustadoramente saiu do corpo e encontrou o homem que lhe disse :
Olá meu nome é Jason, eu sou seu anjo da morte, fui designado a lhe matar, por isso venho observando-a a um bom tempo, estou perdidamente apaixonado por você por isso provoquei sua morte antes do tempo, para estar mais próximo de você ...
Nesse momento Sophia acordou de seu sono profundo e tomou uma decisão, se jogou do ultimo andar do seu prédio, a procura de Jason, o seu amor maligno.


terça-feira, 29 de setembro de 2015

Meu Lindo Mundo


Milena Nogueira

Hoje peguei-me pensando, pensando nas coisas que me rodeiam, o quanto são importantes e que nunca havia realizado. Lembrei-me da cena presenciada hoje, que triste cena, me pergunto hoje o por que de nunca ter enxergado fatos assim e me entristecido muito com tudo isso.
 Ver como é fora do meu mundinho de dores supérfluas, tristezas passageiras, me faz querer chorar, chorar não com as lágrimas que ontem derramei lágrimas sem propósitos, mas sim lágrimas atentas a realidade.
 Quero me fazer acreditar que o ocorrido foi um sonho, na verdade, um triste pesadelo que nunca iria acontecer. Acabou me debulhando em um rio de lágrimas ao perceber que esta é a realidade da vida e que causa pesadelos como esse.
 Por isso não cesso meus prantos, prantos esse que diminuem minha culpa o que eu realmente precisava.

 Quando as lágrimas que meus olhos derramaram acabaram com minha culpa novamente passeia viver no meu belo mundo de felicidade em que eu governava.

COMUM DE DOIS

Tauan Carvalho
E lá estava ele, parado em pé, deparando-se com o seu caos particular, sua cria desde sempre, desde que se entende por gente. Estava cara a cara com o artefato que considerava o pior objeto de tortura: o espelho. Com ele observava todos os detalhes do seu corpo, que configuravam-se para ele como imperfeições. Sentia-se como um estranho no universo, um intruso na redoma, uma ovelha negra, enfim, uma merda. Sentia-se estagnado em relação ao seu futuro, sem saber para onde ir, perdido em si, confuso nos seus pensamentos, desejando para aquilo tudo um fim e tudo isso, todo esse temporal de loucuras e idéias que vão do céu ao inferno em questão de minutos.
Era apenas uma luta entre ele e o seu maior inimigo: ele mesmo. Não se sentia dono de si, possuidor do próprio corpo, tinha consciência de que aquele ser não era ele, era apenas uma idealização de uma parte de uma família perfeita, de um ser perfeito em todos os sentidos possíveis e imagináveis. Queria revelar seu verdadeiro eu, expor toda a sua verdade para o mundo, ser verídico e sincero tanto para si quanto para os outros. Só queria se recriar, fantasiar que ele poderia ser o que quisesse. Em um piscar de olhos, gritos, silêncio, terror, medo e coragem, tomou um fim para si. Despiu-se do pudor, se travestiu e fugiu daquele lugar, daquele espaço de tempo, enfim, fugiu dali.
Adornou-se, enfeitou-se com vestido, salto alto, batom, e foi para o acaso na urbe das maravilhas profanas. Tirou a capa da covardia banal e vestiu-se da armadura de guerreiro, amazona da sua vida. Transformou-se no seu melhor devaneio. Arriscou-se sem medos, nem freios. Pegou o primeiro vagão para o infinito e foi sem se importar com o que deixou para trás, desceu do trem, saiu da estação e entrou na primeira balada que avistou. Com toda a sua lingerie, perfume e rouge, não queria afrontar, apenas se divertir sem arrependimentos, apenas amor para dar e receber.
Entrou na discoteca, se entregou à dança dos achados e perdidos daquela vil cidade. Tornou-se alvo de vários olhares: alguns 43, outros de frigidez, quase todos de estranhamento. Ele sabia e deixava passar, fazia a “egípcia” para eles, só desejava se doar como sacrifício ao desconhecido. Entregou-se aos seus paraísos artificiais, sonhos acordados, beijos de instantâneos amados, manifestações loucas, cortejou a insanidade, osculou a sua ilusão. O salto doía, porém sorria e lembrava que machucava que tinha que omitir. Degustava o prazer e dor de se vestir como mulher. Livre, leve, solto, com seu instinto selvagem amparando o motim.
Enfim saiu da balada, tinha o ímpeto de rolar pela noite sem traços jogando-se no abismo do nosso acaso. Andava feliz pelas ruas iluminadas pelos faróis e outdoors cadentes da urbe das maravilhas profanas, bailando ao som da sua alegria sem medidas, sentiu-se uma pancada na parte posterior da sua cabeça. Iniciava assim a maior tortura real da vida daquele sonhador praticada por dois seres humanos que detestavam a felicidade alheia e não tinham a capacidade de encontrar o entendimento em tolerar a diversidade dos seres vivos e demonstravam assim o pior lado da raça humana, enquanto na mente daquele menino, que se travestiu a fim de ir atrás do final do arco-íris, afagar seu caos com uma dose de verdade em sua vida. Enquanto era espancado com aquelas grandes lâmpadas, recordava-se de tudo o que tinha vivenciado naquela dada noite, sorria como se estivesse satisfeito com todo o seu impulso e logo depois, após uma última pancada, essa que foi a mais forte e drástica, se entregou ás mãos da morte: era o seu fim.


Escreva um conto!


Beatriz Moreno

Certo dia, uma professora da disciplina de Comunicação Oral e Escrita, chamada Elielza, fez uma proposta para turma do curso de Vestuário. Ela queria que todos criassem um conto de tema livre. A classe inteira se animou e não paravam de conversar sobre o que iriam escrever.
Gustavo, um dos alunos, quis escrever sobre um pudim e, Samir, quis fazer um “conto gótico”. Logo, todos se afastaram um dos outros para começar a se concentrar. Porém, Beatriz, não tinha ideia do que iria escrever e então pensou:
“Talvez eu conte sobre minha história de vida... Mas é uma mesmice!”
“Se eu contar um sonho que eu tive, será que vão rir de mim?”
“Acho que vou fingir passar mal e sair da sala...”
Depois de um silêncio aterrorizante, alguns dos alunos começaram a soltar “spoilers” (uma prévia do que estaria escrevendo). Samir resolveu não fazer um “conto gótico”, Larissa e Aila não fizeram um conto sobre o príncipe do pop. Gustavo começou que estava fazendo uma fábula. E Beatriz continuava a pensar:
“A professora deve estar achando que somos loucos!”
“Samir, desliga o celular! Seja técnico!”
“Vou escrever sobre qualquer coisa que eu pensar em 3...2...1...”

- Terminaram?

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

O BAILARINO

                                                                                                                                               



                                                                                                                                             Aila Santana

Tudo começou com uma proposta. Eu era novo na cidade e precisava de um emprego para me manter, afinal de contas, eu não tinha mais os meus pais para me sustentar a muito tempo, já que desde muito novo eu almejava minha a independência, sempre quis as minhas coisas, sempre quis fazer o que bem entendesse com o meu próprio dinheiro e hoje, aos 21 anos, eu consegui essa independência. Desde que sai da casa dos meus pais, eu morava de aluguel ali e aqui, mas sempre por perto da casa deles, só que dessa vez, resolvi ir mais longe, eu mudei de cidade e decidi dividir um apartamento com o meu amigo britânico, apartamento que ficava no centro de Londres, no bairro The City, onde existia um dos pontos turísticos mais lindos do mundo, na minha opinião, a Tower Bridge. Acontece que sempre fui muito independente, como já disse antes, e não queria viver às custas do meu amigo, que já tinha um emprego numa academia que ficava nas redondezas. Foi quando ele me propôs que eu trabalhasse na mesma academia que ele, sendo professor, o que foi perfeito já que amava a área e tinha formação nisso. Confesso que, apesar de estar amando a cidade, me sentia um pouco melancólico, sei lá, era apenas estranho, era como se faltasse algo, ainda mais quando amanhecia chovendo, aquela cidade parecia estar sempre nublada, o que, piorava o meu estado de angustia sem razão.
Até que eu comecei a trabalhar na academia, que era lindíssima por sinal, e lá, eu sentia como se eu esquecesse de todas as minhas paranoias inexplicáveis quando eu via ele dançar. “Quem é ele Ed?”, perguntei no meu primeiro dia de trabalho, completamente encantado ao meu amigo, enquanto eu via aquela criatura perfeita flutuar de forma suave e delicada pela sala de vidro em que dançava, ele era sem dúvidas a coisa mais preciosa que eu já tinha visto em toda a minha vida.
Dono de um par de esmeraldas preciosas, que certamente ele chamava de olhos, pele alva que me fazia fantasiar no quão macia deveria ser, cabelos da cor de ouro com cachinhos adoráveis, boca corada e um par de covinhas que lhe faziam ainda mais encantador, eu simplesmente não conseguia parar de olhar.
“Ah meu amigo... desiste. Só te digo isso, desiste.” Ed me disse dando duas tapinhas no meu ombro, me aconselhando. Eu o olhei meio confuso e perguntei: “Desistir? Porque eu faria isso? Eu nunca vi nada tão... tão... tão impecável como esse garoto. Quem é ele cara?” Insisti ficando ainda mais curioso. “Ele tem problemas, que além de machuca-lo, podem te machucar também, me escuta bem, não se envolve com ele...” Ele disse em tom paterno e eu voltei a olhar para ele, para o bailarino que parecia uma joia rara, a mais brilhante e reluzente de todas “O que uma pessoa como ele poderia fazer para me machucar? Olha só para ele... ele é incrível! Preciso falar com ele, preciso conhecer ele.” Falei sem sentir o sorriso instantaneamente bobo que habitava em meus lábios “Cara, não faz isso, ele já está no estágio final, não tem mais volta, ele está tentando disfarçar, mas decidiu lutar sozinho, você não é o primeiro que se encanta por ele, ele é realmente lindo, mas acredita em mim, você não vai conseguir mudar isso. Ele é perfeito, eu sei, todo mundo sabe, mas sei também de algo que não posso falar e sim, se você se envolver, você vai se machucar. Esquece ele!”.
Meu amigo disse tudo aquilo e saiu, me deixando ali com aquelas palavras na cabeça. Eu não entendi nada. Nada mesmo. Estágio final? Lutar sozinho? Como assim? Eu continuava a olhar o pequeno cacheado e sentir meu peito apertar com tudo, tudo mesmo, afinal de contas, coisa boa é que não deveria ser. Será que eu já estava envolvido? Em tão pouco tempo?
Passando-se algumas horas, a academia fechou e depois de dar uma desculpa qualquer para despistar o Ed, que foi para o apartamento, eu fiquei esperando o bailarino sair, assim, poderia segui-lo, poderia tentar uma conversa, ou sei lá o que eu poderia fazer, só queria ter algum contato com ele, eu precisava daquilo. Chovia muito, mas mesmo assim, o segui debaixo de chuva, ao ver ele deixar a academia. Eu só precisava de coragem para falar com ele, mas a verdade é que eu estava com um pouco de receio, Ed tinha me assustado. Quando finalmente tomei coragem e comecei a andar mais rápido para me aproximar dele, no meio da rua deserta, escura e molhada, o garoto, que aparentava ter 17 anos, simplesmente parou de andar. Eu parei também. O que ele ia fazer? Será que ele sentiu a minha presença ou alguma coisa do tipo? Resolvi me aproximar ainda mais, porem ele continuava parado. “Você está bem?” Quebrei o silencio ao ficar numa distância bem pequena com ele, que estava de costas para mim.
Nem uma palavra, ele não disse nada.
“Ei? Você está bem?” Insisti, erguendo minha mão e, receosamente tocando seu ombro gélido e molhado. E então aconteceu, foi como um flash, foi muito rápido mesmo, só pude ouvir o som de seu corpo pequeno e delicado ir de encontro ao chão encharcado antes mesmo que eu tentasse lhe segurar, assim que lhe toquei o ombro, o garoto foi ao chão. Quando me abaixei para tentar ajudar, para ver o que aconteceu, me veio a surpresa: ele estava simplesmente morto.
Não ouvi sua voz, não senti seu cheiro, não lhe toquei o rosto, não beijei-lhe os rosados lábios, só senti a dor de ver morrer alguém que eu daria tudo por conhecer. Agora o pequeno bailarino vai dançar nas nuvens, vai encantar os anjos, assim como me encantou, vai embelezar os céus e vai flutuar, literalmente. Eu só queria saber porque... O que tinha acontecido afinal?
“Tarde demais para não se envolver, verdade? O câncer o levou, eu sinto muito cara.” Ed me explicou tudo na manhã seguinte, quando soube do que tinha acontecido “Eu te disse para não se envolver”
“A gente não escolhe, nunca escolhemos e nunca vamos escolher. Só chega! Chega e vai na mesma rapidez de um piscar de olhos. É assim que perdemos tudo! A doença não mata, a insegurança é que mata” Disse com um suspiro e um sorriso tremulo nos lábios que jamais dançariam com os lábios do bailarino.



Não perca tempo, não deixe para fazer/dizer algo depois se você pode fazer/dizer agora.





sexta-feira, 6 de setembro de 2013

O Vadio




Ele conhecera dias mais felizes, apesar do estado de miséria e de doença em que agora se encontrava.
Na idade de quinze anos, ficara com as pernas esmagadas por uma carruagem, na estrada real de Varville. Desde então mendigou, arrastando-se ao longo dos caminhos, através dos pátios das quintas, balouçado nas muletas, que lhe tinham feito levantar os ombros à altura das orelhas. A sua cabeça dir-se-ia enterrada entre duas montanhas.
Enjeitado encontrado num fosso, pelo cura de Billette, na véspera do dia de Finados, e baptizado em razão disso, Nicolau Toussaint, educado por caridade, ficara estranho a todo e qualquer grau de instrução, estropiado depois de ter bebido alguns copos de aguardente oferecidos pelo padeiro da aldeia, para que ele fizesse rir, não tardou em dar em vagabundo, e mais nada sabia fazer do que estender a mão à caridade.
Outrora, a baronesa d'Avray concedia-lhe, para dormir, uma espécie de nicho cheio de palha, ao lado do galinheiro, na herdade que se ligava ao castelo: e ele ali estava ao abrigo, certo de, nos dias de grande fome, encontrar sempre um pedaço de pão e um copo de cidra na cozinha. Muitas vezes, recebia também alguns «sous» atirados pela velha senhora do alto da sua escadaria ou das janelas do seu quarto. Porem, ela morrera.
Nas aldeias, não lhe davam nada: conheciam-no por demais; estavam fartos de o ver; havia quarenta anos que o viam passear o deformado de seu corpo andrajoso sobre as suas duas patas de madeira.
Todavia, ele não queria deixar aqueles sítios, porque não conhecia outra coisa sobre a Terra a não ser aquele canto de país, aquelas três ou quatro aldeias onde arrastara a sua vida miserável.
Marcara fronteiras à sua mendicidade e não teria nunca passado os limites que se acostumara a não ultrapassar.
Ignorava se o mundo se estenderia ainda muito para além das árvores que sempre tinham servido de limite à sua vida. Nem sequer o perguntava a si próprio. E quando os camponeses, cansados de o encontrarem todos os dias à beira dos seus campos ou ao longo dos seus fossos, lhe gritavam:
- Porque não vais tu para as outras aldeias, em lugar de andares sempre a muletar por aqui? Ele não respondia, e afastava-se, tomado de um medo vago pelo desconhecido, de um medo de pobre que receia confusamente mil coisas, as novas caras, as injurias, os olhares de desconfiança e suspeita das pessoas que o não conheciam, e os gendarmes que vão dois a dois pelas estradas e que o faziam esconder, por instinto, nas moitas ou por detrás das pedras.
Quando os via de longe, reluzentes ao sol - encontrava de repente uma agilidade singular, uma agilidade de monstro, para alcançar qualquer esconderijo. Saltava nas muletas, e deixava-se cair à maneira de um trapo, rolando como uma bola, tornando-se pequenino, invisível, acaçapado como uma lebre na sua loca, confundindo os seus trapos russos com a terra.
Ele não tivera, no entanto, nada com eles. Mas aquilo estava-lhe na massa do sangue, como se houvesse recebido aquele temor e aquela manha dos seus ascendentes, que não conhecera.
Não tinha refugio, nem tecto, nem cabana, nem abrigo. Dormia por toda a parte, quer de verão quer de inverno, e introduzia-se nas granjas ou nos estábulos com uma ligeireza notável. E raspava-se sempre antes que houvessem dado pela sua presença. Conhecia os buracos para penetrar nas construções; e o manejar das muletas havia-lhe dado aos braços um vigor tão surpreendente, que trepava só à força de pulso até aos celeiros de forragens, onde se conservava quatro ou cinco dias sem bulir, quando havia recolhido no seu giro as provisões suficientes.
Vivia como os animais dos bosques no meio dos homens, sem conhecer ninguém, sem amar ninguém, não excitando aos camponeses mais que uma espécie de desprezo indiferente e de hostilidade resignada. Tinham-lhe posto a alcunha do «Sino» porque se baloiçava, entre as suas duas muletas de pau como um sino se baloiça entre os seus suportes.
Havia dois dias que não comia. Ninguém já lhe dava nada. Por fim, nem já o queriam ver. Os camponeses, dos seus portais, gritavam-lhe quando o viam chegar:
- Vê lá se te queres pôr a andar, tonante ! Ainda não ha três dias que te dei um bocado de pão!
E ele girava sobre as suas estacas e dirigia-se à casa vizinha, onde o recebiam da mesma maneira.
As mulheres declaravam de porta para porta:
- Mas é que a gente não pode dar de comer a este mandrião todo o ano.
Todavia, o mandrião tinha necessidade de comer todos os dias.
Tinha percorrido Saint-Hilaire, Varville e les Bocettes, sem recolher um cêntimo nem uma simples côdea. Só lhe restava uma esperança, era, Tournolles; mas era-lhe preciso caminhar ainda duas léguas pela estrada real, e sentia-se cansado a ponto de não poder arrastar-se mais, tendo o ventre tão vazio como a algibeira.
Apesar de tudo, pôs-se em marcha.
Era em Dezembro, um vento frio percorria os campos, sibilava nos ramos nus; e as nuvens galopavam através do céu baixo e sombrio, apressando-se não se sabe para onde. O estropiado caminhava lentamente, deslocando os seus suportes um após outro com penoso esforço, escorando-se na perna torcida que lhe restava, terminada por um pé aleijado e calçado por um trapo.
De tempos a tempos, assentava-se no fosso e descansava alguns minutos. A fome punha uma grande mágoa na sua alma confusa e pesada. Ele só tinha uma ideia: «comer», mas não sabia por que meio.
Durante três horas, penou na comprida estrada depois, quando avistou as arvores da aldeia, apressou os seus movimentos.
O primeiro lavrador que encontrou e ao qual pediu esmola, respondeu-lhe:
- Tu ainda por aqui ? velho marau!
Então eu nunca me verei livre de ti?
E o «Sino» afastou-se. De porta em porta, correram-no, recambiaram-no, sem lhe darem nada. E ele continuava, apesar disso, o seu giro, paciente e obstinado. Não recolheu um sou.
Então visitou as herdades, caminhando através das terras amolecidas pelas chuvas, por tal forma extenuado que nem sequer podia levantar as muletas. Escorraçavam-no de toda a parte. Era um desses dias frios e tristes em que os corações se fecham, em que os espíritos se irritam, em que a alma está sombria, em que a mão não se abre nem para dar nem para socorrer.
Quando acabou de visitar todas as casas que conhecia, foi cair ao canto de uma vala, ao longo do pátio do tio Chiquet. Despegou-se, como se dizia para exprimir a maneira porque se deixava cair de entre as muletas que fazia escorregar por debaixo dos braços. Ficou por largo tempo imóvel, torturado pela fome, mas era muito bruto para que pudesse penetrar a sua insondável miséria.
Esperava não se sabe o que, naquela vaga esperança que existe constante em nós.
Esperava ao canto daquele pátio, sob o vento gelado, o auxílio misterioso que se espera sempre do céu ou dos homens, sem que se saiba como, nem porque, nem por quem ele nos poderá chegar. Passava um bando de galinhas pretas, buscando a sua vida na terra que alimenta todos os seres. A cada instante, picavam com uma bicada um grão ou um insecto invisível, depois continuavam a sua busca lenta e segura.
O «Sino» olhava para elas sem pensar em nada; depois veio-lhe, mais ao ventre que propriamente à cabeça, mais à sensação que à ideia, que um daqueles animais seria bom para comer assado no borralho de uns troncos secos. A suposição de que ia cometer um roubo nem de leve roçou pelo seu espírito. Pegou numa pedra que se achava ao alcance da mão, e, como a tinha certeira, matou redondamente, atirando logo por terra a ave que estava mais próxima. O animal caíra de flanco, remexendo as asas. As outras fugiram, baloiçando-se nas suas patas delgadas, e o «Sino», escalando novamente as suas muletas, pôs-se em marcha para ir apanhar a sua caça, com movimentos iguais aos das galinhas.
Ao chegar perto do pequeno corpo preto manchado de vermelho na cabeça, recebeu um empurrão terrível pelas costas, que o fez cair das muletas e o fez rolar a dez passos para a frente.
E o tio Chiquet, exasperado, precipitando-se sobre o pilha, encheu-o de pancadas, batendo como um furioso, como bate um camponês roubado, com o punho e com o joelho por todo o corpo do enfermo, que não podia defender-se.
As pessoas da herdade chegaram por sua vez e puseram-se com o patrão a sovar o mendigo. Depois, quando se cansaram de lhe bater, agarraram nele, levaram-no e fecharam-no na casa da lenha, enquanto iam em cata dos gendarmes.
«Sino», meio morto, sangrando e estoirando de fome, ficou deitado no chão. Chegou a tarde, veio a noite, depois a aurora, e ele sem comer.
Pelo meio dia, os gendarmes apareceram e abriram a porta com precaução, esperando uma resistência, porque o tio Chiquet dizia ter sido atacado pelo vadio e ter-se defendido a grande custo.
O cabo bradou:
- Vamos! leva arriba!
Mas «Sino» não se podia mexer; ainda tentou içar-se nos seus suportes, mas não o conseguiu. Julgaram que era fingimento, que era manha, que era má vontade do malfeitor, e os dois homens armados trataram-no asperamente, empunharam-no e plantaram-no à força sobre as muletas.
O medo apossara-se dele, aquele medo inato que os desgraçados têm das correias militares, o medo da caça em presença do caçador, do rato diante do gato. E, com esforços sobre-humanos, lá conseguiu pôr-se em pé.
- Marche! disse o cabo. Ele marchou. Todo o pessoal da herdade o via partir. As mulheres mostravam-lhe o punho; os homens chacoteavam-no, injuriavam-no: tinham-lhe dado fim! Estavam livres.
Ele afastou-se entre os dois guardas. Achou a energia desesperada que lhe era precisa para se arrastar ainda até à noite, embrutecido, não sabendo nem sequer o que lhe sucedia, assustado por demais para que pudesse compreender.
As pessoas que o encontravam detinham-se para o ver passar, e os camponeses murmuravam:
- É algum ladrão!
Pela noitinha, chegaram à comarca. Ele nunca tinha ido até ali. Não dava verdadeiramente conta do que se passava nem do que lhe podia acontecer. Todas aquelas casas novas o consternavam.
Não pronunciou mais uma palavra, nada tendo a dizer, porque nada compreendia. Desde muitos anos que não falava a ninguém, por isso quase perdera o uso da linguagem; e o seu pensamento estava também muito confuso para poder formular palavras. Encerraram-no na prisão da vila. Os gendarmes não pensaram em que ele poderia ter vontade de comer, e deixaram-no até ao outro dia.
Mas, quando vieram para o interrogar, logo de manhãzinha, acharam-no morto, no chão.
Que surpresa!

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Imagem: Pedro Nogueira Rocha

Confidência 

                                                                                                            Elly Ramos
Quando você me desnuda com palavras, das quais nenhum outro ousou me dizer, sinto a carne fraquejar e desvio o sentido. Eu que sempre fui romântica, avessa às “liturgias” do querer, dá-me medo e ao mesmo tempo despertam fantasias que internalizei por algum capricho, pudores que a mim puseram... Penso na modelo e no fotógrafo nus, ele a captar a beleza, a sensualidade, a alma... e ela se vê nos olhos dele. Mas será que é só um sentir fisicamente? Será? Não. Você, o único eleito a ser o meu amor platônico, não espero envolvimento de sua parte, seria puerilidade demais. Preciso dizer que não seria eu, jamais, a O de René, nem a Jude, talvez, a Virgínia do Machado de Assis.